Read Ebook: O Engeitado by Braga Alberto Leal Barradas Monteiro
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Ebook has 226 lines and 8834 words, and 5 pages
cipiava a nascer nos campos o centeio, o Sim?o preparava as palheiras com o visco, collocava-as em sitio apropriado, e escondido com os amigos entre as giestas dos vallados, espreitava d'ali que os pardaes cahissem. Jogava o eixo e o bot?o com os rapazes que sahiam da escola. A Magdalena preferia-o a todos. N?o a largava nunca; e se o Sim?o, nas duvidas do jogo, se pegava com alguns rapazes mais alentados, Magdalena punha-se da banda d'elle, e arremettia valentemente.
Mas o Sim?o principiou a n?o querer sahir. Ia a Magdalena para a rua, e ficava elle s?sinho em casa, encostado ? janella, vendo a brincar de dentro dos vidros. Andava muito pallido e murcho; e, se se encostava sobre uma caixa, adormecia.
--Tu tens morrinha, rapaz--dizia-lhe a Josepha assustada e afflicta.--Tu, que te doe, menino?
O rapaz n?o se queixava; mas a Josepha n?o tinha socego.
Foi um dia de manh?, quando o Sim?o almo?ava ao p? de Magdalena, que a Josepha reparou que elle engolia o p?o com esfor?o. Chamou-o logo junto de si, e apalpou-lhe o pesco?o. Sob a press?o dos dedos sentiu a dureza dos ganglios enfartados por detraz das orelhas.
--Tens humores frios, filho!--exclamou ella com uma voz dilacerante.--Doe-te?
As duas crian?as, ao verem a cara assustada e afflictiva da m?e, desataram ambas uma risada.
--N?o doe nada, n?o, minha m?e--asseverava elle.
N'esse mesmo dia, a Josepha vestiu-lhe camisa lavada e o melhor fato, e foi com elle a casa do padrinho.
--A Lena n?o vem?--perguntava o Sim?o com pena de a deixar s?.
Pelo caminho, a id?a da separa??o aterrava-o.
--Eu n?o torno a ver a Lena, minha m?e?--insistia elle, virando para a Josepha os olhos supplicantes.
Ao chegarem a casa de D. Bernardo, a mulher explicou o motivo da visita.
--O pequeno sahiu enfezadito, meu senhor. Anda triste, come pouco, e agora veja v. ex.?
E expunha aos olhos do fidalgo o cacha?o rubro e inchado do rapaz.
--Apalpe aqui. V? v. ex.?? O rapazinho padece de humores frios.
D. Bernardo apalpou; e, ao ver ali o engeitado, com a carita muito pallida, magro, abatido, com a tristeza melancolica das crian?as doentes o que ? como um presentimento da morte, teve sincera commisera??o.
--Leve-o de meu mando ao cirurgi?o--disse elle.--E o que receitar, que lh'o aviem na botica por minha conta.
E quando a Josepha ia a sahir chamou-a atraz.
--Olhe, mulherzinha; e precisando de mais alguma coisa appare?a por aqui.
O cirurgi?o receitou ferruginosos e banhos do mar.
Por esse tempo, recebeu D. Bernardo uma carta da irm? freira, dizendo que o medico lhe prescrevera o uso de banhos do mar. Para n?o incommodar o mano, tinha indagado no recolhimento se alguma senhora iria ?s praias; mas, infelizmente, nenhuma ia! Era uma desgra?a!
Respondeu o morgado que pedisse a mana ao sr. arcebispo licen?a para sahir e iria elle acompanhal-a ? Povoa de Varzim, logo que findassem as vindimas. Accrescentava que levaria comsigo um engeitado seu afilhado, que padecia de escrofulas. Recommendava-lhe que pedisse saude e a gra?a de Deus, que trabalhos e canceiras n?o faltavam n'este mundo!
No meado de outubro, por um tempo secco, mas um pouco frio dos ventos outomni?os, appareceu na Tojeira a irm? do fidalgo seguida de uma criada velha.
Resolveram partir na madrugada do dia seguinte para a Povoa.
Na vespera, antes de se deitar, esteve a Josepha a apertar n'uma pequena trouxa a roupinha do engeitado.
--Tu porta-te bem, Sim?o--recommendava-lhe ella.--Olha que aquelles fidalgos s?o os teus bemfeitores. Ouviste?
O pequeno ouvia-a sem poder falar. Sentia comprimida a garganta e os olhos embaciados de lagrimas. Passou quasi toda a noite em claro. A id?a da separa??o proxima fazia o chorar copiosamente.
Escondia a cabe?a debaixo do len?ol; e alli, collado ? parede, chorava e solu?ava baixinho, com receio de acordar a Lena. S? muito tarde, prostrado pela commo??o, ? que adormeceu.
Rompia a luz da madrugada pelas frinchas da janella, quando a Josepha se levantou. Chegou-se ? cama do pequeno, abanou-o e acordou-o.
--Sim?o, ? Sim?o!
O rapaz ergueu-se atarantado.
--Veste-te, filho. Anda, que s?o horas.
O Sim?o saltou abaixo da cama, e principiou a vestir-se de vagar, atordoado, sem dar tino do que fazia.
A Josepha ajudava-o com o cora??o opprimido, mas fingindo n?o comprehender a tortura do pequeno.
--N?o fa?as bulha, que acordas a Lena--recommendou ella a meia voz.
Mas do leito da m?e, a Lena ouviu e respondeu:
--Eu n?o durmo, minha m?e.
E sentou-se na cama, para se vestir ? pressa.
Quando o pequeno estava vestido e prompto, a Josepha sobra?ou a trouxa, e disse resolutamente:
--Vamos, filho, vamos.
A Lena tambem queria ir.
A m?e oppoz-se, dizendo que estava a manh? muito fria. Lena desatou a chorar, voltada para o lado.
Na occasi?o que a Josepha abriu a porta da casa para sair, o Sim?o ficou um momento hesitante e ancioso. Appro-ximou-se da Magdalena; e, com um sorriso contrafeito, como a querer suster as lagrimas, despediu-se com uma voz suffocada:
--Adeus, Lena.
A pequena n?o respondeu. Com as costas voltadas para elle, immovel no meio do quarto, encolheu os hombros.
--Adeus, Lena--repetiu elle mais alto e a chorar.
Ent?o a pequena, n'uma grande effus?o de ternura, lan-?ando-lhe os bra?os ao pesco?o, beijou-o repetidas vezes:
--Adeus, Sim?o.
E quando o engeitado ia j? longe, pelo atalho f?ra, ao lado da m?e, Magdalena da porta da casa seguia-o com os olhos cheios de lagrimas e dizia-lhe baixinho adeus, acenando com a m?o:
A familia da Tojeira esteve um mez a banhos na Povoa de Varzim. Habitava uma casa pequena na rua da Junqueira. A sr.? D. Leonarda levantava-se de madrugada, e ia para a praia, seguida da criada e do Sim?o.
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