Read Ebook: Novo dicionário da língua portuguesa by Figueiredo C Ndido De
Font size:
Background color:
Text color:
Add to tbrJar First Page Next Page Prev Page
Ebook has 198 lines and 1556165 words, and 4 pages
A tal respeito, foram sempre vulgares as queixas de professores e estudiosos contra a falta de um vocabul?rio nacional, que comprehendesse com alguma largueza a technologia mais corrente entre os homens de sci?ncia.
Dei-me ao trabalho incalcul?vel de estudar nas fontes respectivas a technologia bot?nica, geol?gica, anat?mica, philos?phica, m?dica, ch?mica, radiogr?phica, etc.; e muitas vezes, ? mingua de compet?ncia encyclop?dica, tive de me soccorrer da compet?ncia e obsequiosidade de muitos dos nossos mais not?veis homens de sci?ncia, aos quaes se deve certamente o melhor quinh?o nos servi?os que ?ste livro possa prestar aos estudiosos de technologia scient?fica.
Confessarei, sem hesitar, que uma das sci?ncias, em que se me depararam maiores dificuldades, foi a Bot?nica geral:--Num diccion?rio da l?ngua, ?at? onde deveria chegar o registo dos seres vegetaes, dos seus ?rg?os e dos seus phen?menos biol?gicos? A quem deveria eu seguir nas classifica??es do reino vegetal? Linneu? De-Candolle? O Congresso de Paris de 1867?...
Mas n?o eram simplesmente taxin?micas as difficuldades que a Bot?nica me oppunha: provinham tamb?m da amplitude num?rica, que, num diccion?rio da l?ngua, se deveria dar aos g?neros e esp?cies do reino vegetal.
? verdade que muitos milhares de plantas a?nda n?o perderam a sua designa??o exclusivamente scient?fica e difficilmente se adaptariam d?sde j? ? nossa linguagem vulgar; mas muit?ssimas h?, cujo nome ? perfeitamente romaniz?vel, como outras h?, em que a designa??o vulgar e a scient?fica precisamente coincidem, t?o estreito ? o parentesco entre o portugu?s e o latim.
Occorri ? difficuldade, conciliando, quanto em mim coube, a conveni?ncia, se n?o necessidade, de enriquecer um diccion?rio da l?ngua com um amplo onom?stico bot?nico, e a impossibilidade de realizar nesse diccion?rio o que a?nda n?o conseguiram os pr?prios vocabularistas bot?nicos.
Quanto por?m ? Bot?nica portuguesa, continental e colonial, e quanto ? Bot?nica brasileira, tudo me aconselhava que registasse quanto as minhas investiga??es me deparassem.
Na pr?pria Bot?nica do nosso pa?s, e n?o obstante o muito que j? lhe consagraram outros diccion?rios, tive ensejo de reconhecer, pelos livros dos nossos ampel?graphos, pelos relat?rios dos agr?nomos, pelos jornaes de agricultura e pelo trato directo com a gente do campo, que muitos frutos e muit?ssimas esp?cies de plantas ?teis ainda n?o pertenciam ? lexicographia, tendo eu que registar mais de 1:500 variedades de videiras, e numerosos frutos, que entraram h? muito na linguagem do povo e que s? agora entram no vocabul?rio portugu?s.
Na parte scient?fica do meu l?xico, n?o foi s?mente a Bot?nica o que me abriu campo extenso e diff?cil: a Ch?mica n?o me offerecia muito menores difficuldades.
E n?o foi s? a exagerada complica??o das f?rmulas adoptadas recentemente pelos nomencladores ch?micos o que fez sustar o passo nas minhas excurs?es por aquella prov?ncia do saber humano; foram tamb?m, n?o direi o abuso, mas o arb?trio, com que a pharmacologia de hoje se d? ao apparatoso luxo de inventar vistosos r?tulos para os seus productos, ? custa da Ch?mica e da Pathologia.
Entretanto, pelo esf?r?o pr?prio e pela coopera??o de alguns dos nossos mais not?veis homens de sci?ncia, consegui registar largamente a nomenclatura ch?mica, em vis?vel despropor??o com o que at? agora, e a tal respeito, se tinha feito em trabalhos cong?neres.
E, contudo, nenhum diccion?rio portugu?s apresentou ainda t?o copioso vocabul?rio entomol?gico, como o diccion?rio que estou prefaciando.
Em Ornithologia, consegui refundir lexicographicamente o respectivo vocabul?rio, n?o s? ampliando com centenares de variedades o registo, por outros feito, das aves portuguesas, mas tamb?m dando dellas no??o mais exacta, do que aquella que at? hoje podiamos adquirir pelos diccion?rios.
?stes e outros factos an?logos, facilmente verific?veis, d?o-me a persuas?o de que a parte ornithol?gica desta obra revela os devidos escr?pulos, o poss?vel rigor, e sens?veis melhorias na lexicographia nacional.
O autor, neste caso e em casos semelhantes, n?o fala por vaidade nem faz alarde de servi?os e m?ritos: julga cumprir um dever, historiando os seus processos e o seu trabalho, para auxiliar o leitor no conhecimento e avalia??o da obra. Contraprovadas por ?ste as allega??es e os factos, fica-lhe o plen?ssimo direito de julgar a obra como lhe aprouver. Mas, antes que a julgue, requeiro que me oi?a.
Mais importantes ainda f?ram as contribui??es que eu devo ? Anatomia, ? Medicina geral e, especialmente, ? Ophtalmologia, ? Psychiatria, ? Homeopathia, ? Electrotherapia, etc.
Os mais consp?cuos especialistas nestas sci?ncias distinguiram-me com as suas luzes, com os seus livros, com o seu carinhoso aux?lio, o que me autoriza a affirmar que em nenhum diccion?rio portugu?s essas sci?ncias lograram ainda t?o largo espa?o como na presente obra.
O mesmo se p?de dizer da Radiographia, da Veterin?ria, da Agricultura, da Geologia, da Architectura, das ind?strias fabris, da N?utica antiga e moderna, da Pedagogia, da arte militar, da Velocipedia, do Espiritismo, dos off?cios mec?nicos, da Jurisprud?ncia, das antiguidades gregas e romanas, da Ethnologia, dos jogos, dan?as, e usos populares, etc., etc.
Reunidos os materiaes atrav?s de duas dezenas de annos e ? custa de incompens?veis fadigas, dois caminhos se me antolhavam:--Organizar um desenvolvido diccion?rio que poderia abranger seis a oito grossos volumes; ou synthetizar aquelles materiaes no mais limitado espa?o.
Na primeira hyp?these, seria mister um editor arrojado, se n?o temer?rio, o que ? raro; e ao autor, seria mister vida longa, o que ? ainda mais incerto. Aventurei-me ? segunda hyp?these, e nem por isso foi menos arrojado o meu saudoso amigo e honrad?ssimo editor, que n?o hesitou em jogar s?bre o meu trabalho uma dezena de contos de r?is.
Uma condi??o me imp?s apenas: reunir todos os materiaes, colhidos por mim, a tudo que os outros diccion?rios tivessem de aproveit?vel, e organizar uma obra, cujo pre?o a n?o tornasse incompat?vel com os recursos pecuni?rios da maioria do p?blico que l?.
Era tarde para voltar atr?s, e seria qu?si imposs?vel recordar, entre centenares de livros, o livro e a p?gina que contribuiu para o meu vocabul?rio.
Como por?m um triste successo retardou por dois annos a publica??o da obra, e como at? hoje nunca cessou a colheita de novos voc?bulos e novas accep??es, pude remediar o que era remedi?vel, e, nas novas colheitas, pude justificar com cita??es succintas o registo de um ou outro voc?bulo, de uma ou de outra accep??o.
A linguagem n?o ? inventada pelos diccionaristas: falada ou escrita, registam-na, e deixam a responsabilidade della aos que a criaram.
Mas h? circunst?ncias, em que a men??o de um voc?bulo poderia s?r apodada de destemp?ro pelos leitores mais inclinados ? maledic?ncia do que ? justi?a.
Por outro lado, colligi numerosos voc?bulos, cuja significa??o n?o resalta do texto em que se me depararam. Claro ? que, em tal hyp?these, o processo prefer?vel ? registar o voc?bulo e citar o texto respectivo, para que os leitores o interpretem, se puderem.
Muitas vezes, se n?o qu?si sempre, as refer?ncias a obras alheias levam a indica??o do tomo e p?gina respectiva, n?o s? para se facilitar a contraprova ao leitor escrupuloso, se n?o tamb?m e principalmente para obviar ?s supposi??es gratuitas de cr?ticos praguentos e mal intencionados, que, julgando por si os mais, admittem a possibilidade de que qualquer escritor tenha a improbidade de inventar cita??es por conveni?ncia pr?pria.
? verdade que, em muitos casos, a obra citada teve duas ou mais edi??es, e ? diversa a pagina??o destas, difficultando assim o cotejo. Em todo caso, a difficuldade n?o ? impossibilidade; importa apenas algum trabalho para o cr?tico mais minudencioso, por t?r de consultar diversas edi??es da mesma obra.
Excepcionalmente, cito uma ou outra locu??o sem indicar as fontes escritas, porque a recebi da linguagem oral ou dos registos avulsos e dispersos do falar do povo, como as can??es populares, os prol?quios, etc.
H? toda a conveni?ncia, e de bom grado a subscrevo, em que se annotem de archa?smos os termos que se afastam da linguagem commum do nosso tempo e da pr?tica dos mestres contempor?neos. Reconhe?o por?m a difficuldade de, em muitos casos, capitular de archaico um termo que, pela primeira vez, nos occorre em documento antigo. Nenhum de n?s, os que escrevemos, conhece metade dos termos da sua l?ngua, e, como j? notei, muitos julgar?o archaico um voc?bulo, que s? vimos usado em escritores quinhentistas ou pre-quinhentistas, e que p?de deparar-se-nos acaso no uso corrente de alguma regi?o portuguesa, e at? na escrita de algum escritor moderno.
Essa nota por?m n?o quere dizer que todos ?lles sejam perten?a exclusiva de ?pocas findas e que n?o possam nobilitar e enriquecer a escrita moderna, embora a adapta??o dependa de muito bom senso, alguma autoridade, e de opportunidade sempre. Succede, at?, que muitas express?es, realmente de cunho antigo, tendo pertencido a usos e institui??es que passaram, h?o de necessariamente empregar-se ainda hoje, sempre que tenhamos de nos referir a essas institui??es e usos.
Temos disso copiosos exemplos em Herculano.
Quanto ? disposi??o das v?rias accep??es de cada voc?bulo, segui, ?s vezes, o processo da Academia Francesa, dando o primeiro lugar ? accep??o mais vulgar ou conhecida, quando a accep??o primitiva ? inteiramente obsoleta, e deixando esta para o fecho do artigo. Em regra, por?m, e de ac?rdo com os mais autorizados lexic?graphos, dou o primeiro lugar ? accep??o natural ou primitiva, consignando sucessivamente a extensiva e a figurada, quando para um voc?bulo h? variedade de accep??es.
A orthographia, que, para os antigos padres-mestres, era uma parte da gramm?tica, est? reduzida actualmente a um intricado e curioso problema.
?parte meia d?zia de eruditos, que tomam o assumpto a s?rio, a generalidade dos nossos escritores modernos observam a orthographia que lhes ensinaram ou aquella a que se habituaram, preoccupando-se mediocremente com a raz?o do que escrevem.
?ste facto, s? o n?o v? quem f?r cego de vontade.
De maneira que os diccionaristas, julgando que tem igual direito ao dos outros escritores, escrevem geralmente como entendem, condemnando implicitamente todas as f?rmas divergentes.
Ora, o diccionarista n?o tem o direito de escrever somente como entende. A sua miss?o n?o ? preconizar systemas, nem fazer reformas, nem manter intolerantes exclusivismos. ?parte os termos que ?lle s? conhece de outiva ou que colheu da linguagem oral, e que tem de reproduzir phoneticamente, se a etymologia, a a deriva??o, ou a analogia lhe n?o aconselham outro processo, todos os voc?bulos que ?lle viu escritos, sob a responsabilidade de um escritor antigo ou moderno ou sob a chancella da pr?tica corrente numa ?poca, tem de os reproduzir taes, quaes os viu; e, se a f?rma var?a de escritor para escritor ou de ?poca para ?poca, essas variantes devem fazer parte do seu trabalho, sob pena de sens?veis imperfei??es ou de lastimosas defici?ncias.
--<
E, j? antes de Moraes, o audaz e superior esp?rito do grande Lu?s Antonio Verney reconhecia a improficuidade dos seus esfor?os em tornar simples e racional a complicada, e por vezes absurda, orthographia acad?mica. Dizia ?lle:
--<<...isto de emendar o mundo e principalmente o querer arrancar certas opini?es do animo dos homens envelhecidos nellas e consagradas j? por um costume de que n?o h? memoria, ? neg?cio que excede as for?as de um s? homem...>>--
E o Padre Ant?nio Vieira sentenciava:
--<
Quando humanistas e lexic?graphos da craveira de Verney e Moraes recuavam perante o colosso da rotina e da indifferen?a, ?de que valeriam os meus esfor?os a favor da poss?vel simplifica??o orthogr?phica, embora estribados no saber e na convic??o dos poucos que, entre n?s, logram incontest?vel compet?ncia em mat?rias philol?gicas?
Como n?o escrevo gramm?tica, nem fa?o aqui um tratado de Philologia, n?o ampliarei desmedidamente esta palestra, consignando os fundamentos daquellas rigorosas f?rmas, ali?s t?o velhas como o portugu?s, em quanto as contr?rias se baseiam em costumeiras, as mais velhas das quaes n?o t?m dois s?culos e foram determinadas pelo mais absoluto desconhecimento da sci?ncia da linguagem, pela pobreza de nota??es typogr?phicas, e pela indol?ncia ou idiosyncrasia de uma na??o, que, entre as na??es que se dizem cultas, ? das raras, que ainda n?o consideram a accentua??o gr?phica elemento imprescind?vel da orthographia.
Para os tratados especiaes remeto pois o leitor menos affeito a taes assumptos, e hesitante ainda em quaesquer hyp?theses orthogr?phicas.
Abro por?m uma excep??o, visto como esta obra vai parar a muitas m?os, que s? folhearam algum comp?ndio escolar e que n?o podem folhear todas as obras que se t?m escrito com mais correc??o, nem os livros e disserta??es, que j? temos em nossa l?ngua s?bre quest?es philol?gicas.
? para ?sses meus ing?nuos compatr?cios que eu vou trasladar para aqui o que, a tal prop?sito, deixei escrito noutro livro meu:
Quanto a outras graphias, que possam ferir a vista dos mais ing?nuos ou dos menos lidos, julgo inopportuno alargar explica??es, n?o s? porque isso me daria volumes e n?o um pref?cio, sen?o tamb?m porque, a tal respeito, creio bem que me n?o far?o reparos os que na mat?ria t?m voto preponderante. Conhe?o-os, e vou com ?lles, salvo discrep?ncias adi?phoras.
Esta explica??o abrange muitos outros casos an?logos e revelar? que me esforcei por levar um pouco de ordem e coher?ncia ? nossa cha?tica e maltratada orthographia.
A Philologia n?o soffre com ?ste uso, e lucra-se alguma coisa, creio, em simplicidade e em coher?ncia.
Add to tbrJar First Page Next Page Prev Page