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Read Ebook: A Divorciada by Vieira Jos Augusto

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Ebook has 1622 lines and 43427 words, and 33 pages

e com um geito feminil, delicado, levantou-lh'o de sobre o penteado, emquanto a Amelinha, quieta como uma crean?a que se enfeita, esperava n'uma attitude passiva.

A Bastinhos principiou logo a fallar, tinha uma grande verbosidade, muita volubilidade nos pensamentos, de quem tem muito a descrever, mas que o faz sem methodo.

--A modista, os passeios, o theatro, se n?o sabia do ultimo escandalo da mulher do commendador Bernardo, que f?ra uma vergonha, que o marido ia requerer o divorcio.--

--Estou admirada!--dizia-lhe Ermelinda.

--? o que te digo, menina, e ent?o com quem, v? se adivinhas?--

--N?o, que n?o adivinhava.--

--Com o Alberto, filha, com o Alberto!--e desatou n'uma gargalhada crystalina, debru?ando-se sobre o bordado a matiz, muito curiosa.

Ermelinda sentiu as pernas tremerem-lhe; a sua physionomia invadiu-se rapida d'uma pallidez pronunciada; o seu desejo seria ter n'aquelle momento uma explos?o de colera, de lagrimas; mas a Amelinha Bastos estava ali e a sua presen?a suffocava-a, como uma mascara que nos affogueia o rosto.

--Se queria tomar alguma cousa--perguntou-lhe--tinha-se esquecido.--

--Nada, nada!--

--V? l?, menina?--

--Tens tu por ahi Xerez? ? do vinho que mais gosto, meu marido aprecia-o muito!--

--Que ia buscar-lh'o n'um instante, que a desculpasse por ter de ficar s?.--

--? vontade, filha, ? vontade--e pegou no romance que Ermelinda estava lendo, em quanto esta se retirava a buscar-lhe o Xerez.

D'ali por momentos Ermelinda entrou com uma pequena salva de prata, onde vinha uma garrafa de crystal e dous calices; a Amelinha muito prompta, com grande espalhafato, foi ajudal-a. Ella mesma encheu os calices e tomando um, disse com modo desenvolto:

--? tua felicidade, Ermelinda.--

--Obrigada, menina.--

Mas os seus olhos turvaram-se d'umas lagrimas, depressa occultas n'um len?o em que fingiu assoar-se; dentro mesmo ella tinha chorado, agradecendo no seu intimo ? Amelinha aquelle desejo do Xerez, que lhe dera uns instantes de isolamento.

--E o teu namoro, como vai, menina?--

--Oh, filha, se queres que te diga...--

--Pois tinham-me asseverado que te casavas.--

--Credo, nem se pensou em tal!--Mas como desejasse evitar a continua??o da conversa:

--E tu, como te d?s com o Guilherme?--

--Bem, filha, magnificamente!--

--Por emquanto n?o tenho ras?o de queixa; o Guilherme n?o v? outra cousa diante dos olhos; at?, se queres que te diga, ?s vezes chega-me a aborrecer com tantas pieguices.--

--Ingrata...--

--Ingrata, n?o! Mas tu o sabes... sou assim um poucochinho estroina... n?o gosto de homens t?o serios e t?o p?ccos.--

--Olha, menina, ? n'essas pequenas coisas que consiste a felicidade.--

--Boa! ahi queres tu pr?gar-me um serm?o de moral! oh, menina, enche-me este calice; mas ainda agora reparo que tens lagrimas nos olhos!

--Lagrimas, eu! est?s doida!--

--Coitadinha da pequerrucha, que quer illudir uma mulher casada--disse arrastando a voz n'um chilrear cantadinho--e batendo-lhe na face palmadinhas amigaveis, animando-a, pedindo-lhe a confidencia d'aquelle ch?ro.

--Que n?o era nada; ?s vezes ficava assim nervosa, tinha d'aquellas extravagancias.--

--Nervosa, tambem ella era muito! o dr. Arnaldo Braga dizia que era todo o seu mal--e a Amelinha principiou a explicar, com grande volubilidade, as impress?es que sentia ouvindo musica, ao ver no theatro um drama triste, ou ent?o quando o seu gato preto, em certos dias, se lhe atravessava no caminho e ella, sem querer, lhe pisava a cauda e ouvia o miar queixoso do animal.

--Muito nervosa, muito! este anno vou at? para a Foz e tomo um grande numero de banhos; j? combinei com o Guilherme.--

--?s feliz, menina, ?s feliz!--

--Assim!...--fez Amelinha contrahindo o labio com certo desdem! e curvando-se disse-lhe ao ouvido uns segredinhos quentes, que fizeram enrubescer Ermelinda.

--Ora!--respondeu esta--p?de l? ser isso!--

--? o que te digo, filha!--e a Amelinha, pondo-se em p?, principiou a passear, cantarolando a can??o do Rigolleto:

<>

N'este momento o velho relogio de Jorge bateu as duas horas.

--Ai! t?o tarde! Credo! Adeus, menina, vou-me embora!--

--J??--

--J?; ainda tenho de ir ao Pinheiro, a Cedofeita. Preciso umas guarni??es para o meu vestido d'esta??o.--

--N'esse caso n?o te demoro!--e Ermelinda, collocando-lhe de novo o chapeu, fazia-a prometter que viria mais vezes, para passarem um bocadinho juntas.

--Estou ?s vezes t?o s?!--

--Pois hei-de vir, filha, hei-de vir! e pondo-lhe na face uns beijos sonoramente cantados, a Amelinha, affogueada pelas irradia??es do Xerez, muito alegre como um passaro na Primavera, desceu o v?o de tulle branco sobre o rosto e sahiu, batendo com grande estrondo a porta da campainha.

--Sempre est? uma douda!--disse Ermelinda vendo-a sahir!--e ap?s um silencio de reflex?o:

--E adeus, s?o estas as que s?o mais felizes!

Ainda n'aquella noute o Alberto deix?ra de apparecer. No dia immediato era Domingo.

Dentro, nos quartos, a contrastar com essa monotonia aceiada para os que vem de f?ra, sem descal?ar as luvas, analysar os nossos albuns e criticar os nossos moveis, uma desordem perturbadora, pregui?osa, reles, cortada pelo cheiro ammoniacal de roupa suja, espalhada no ch?o, sobre as cadeiras, n'um monte desordenado. A commoda d'Ermelinda, com as suas gavetas abertas, ostentava brancuras de saias, de penteadores, de camisinhas, e umas pequenas caixas de cart?o, com estampas lithografadas, d'onde sahiam perfumes e folhas seccas, aromaticas. O cofresinho das joias abria-se indiscreto patenteando objectos d'ouro com finas perolas, brilhantes miudos, como olhares luminosos que pareciam espreitar da mollesa macia do setim azul.

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