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Read Ebook: Poetas do Minho I - João Penha by Pimentel Alberto

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Ebook has 179 lines and 11237 words, and 4 pages

ALBERTO PIMENTEL

Poetas do Minho

JO?O PENHA

BRAGA

CRUZ & C.?--EDITORES

MDCCCXCIV

POETAS DO MINHO

BRAGA

TYP. <>

Jos? Maria de Souza Cruz

ALBERTO PIMENTEL

Poetas do Minho

JO?O PENHA

BRAGA

LIVRARIA ESCOLAR DE CRUZ & C.?

EDITORES

Aquelle meu espirito opulento, Que vivia na luz dos sonhos bellos, Jaz ha muito nas ruinas dos castellos, Que no ar edifica o pensamento.

<<... Quem publica um livro n?o o faz para o ler, publica-o para que os outros o leiam. Quer, portanto, produzir um effeito qualquer, effeito que, em todo o caso, n?o pode ser o do somno: para este ha o opio, a belladona e o Codigo do Processo Civil.>>

--Bai cheio. Num ha logar.

--Por que n?o escreve as suas memorias de Coimbra?

--N?o tenho tempo, respondeu elle. Encheriam tres volumes.

Tres volumes, de certo, porque Jo?o Penha foi o chefe de um cenaculo numeroso, que viveu na alegria e nas lettras, que teve aventuras e triumphos, e que legou aos cursos subsequentes uma gloriosa historia ainda hoje rememorada com prestigio na tradi??o academica. Elle, erguido no pedestal que o voto unanime dos seus contemporaneos lhe havia consagrado, via do alto, como um idolo, toda a nervosa multid?o da academia, que o adorava, observava todas as evolu??es caprichosas d'essa legi?o gentilissima de rapazes talentosos, que se moviam em torno d'elle, conhecia todos os segredos da biographia de uma gera??o, que ha de ficar eternamente lembrada. Tres volumes, pelo menos, e n?o seriam de mais.

E, mais infelizes ainda, os que hoje n?o fazem leis, nem minutas, nem aggravos, nem compendios, dormem prematuramente o somno da morte na apothe?se serena, sem invejas, mas tambem sem desillus?es, d'aquelles que, como Gon?alves Crespo, brilharam pelo clar?o do seu talento, e passaram como um meteoro fugitivo.

Tive Gon?alves Crespo por companheiro na Redac??o da Camara dos Pares. O seu espirito doirava-se ainda de um reflexo de alegria, sem constrangimento, que era como que o ultimo elo da sua tradi??o academica. Tinha passado de Coimbra para Lisboa serenamente, sem tempestades da vida, que envelhecem a alma antes do alvejar da primeira c?. Na paz domestica do seu lar, a morte foi como um salteador que surprehende um viajante a dormir na pousada, e o estrangula entre dois bra?os de ferro n'um momento. Os outros que ficaram ainda, s?o como as arvores no outomno, que dia a dia v?o sendo sacudidas e abaladas pela nortada agreste, que annuncia o inverno.

Esse, Jos? Frederico Laranjo, t?o amante de fallar nos palratorios de Coimbra, vai estando t?o mudado hoje, que j? ninguem treme de medo quando elle pede a palavra na camara.

--E Junqueiro? o nosso astral Guerra Junqueiro? perguntar-me-ha o luciolante apostolado que o rodea na cervejaria do Camanho.

Junqueiro, se houvessemos de dar credito a todas as suas apprehens?es pathologicas, est? <>. Sinceramente desejo que os factos venham desmentir esta apprehens?o.

E talvez n?o sejam.

O tempo rolou a sua pesada mole por sobre as illus?es d'esses rapazes que eram ent?o a fina fl?r da gera??o academica. D'elles, os que n?o est?o ainda velhos por f?ra, come?am a descair na tristeza, n?o direi do occaso da vida, como apprehensivamente affirmou de si mesmo Guerra Junqueiro, mas da experiencia dura do mundo.

Jo?o Penha, o primaz da tribu, ? advogado em Braga, trabalha honestamente para sustentar a sua familia. Est? ao corrente de todas as novidades litterarias que a Fran?a inventa e exporta, porque as recebe directamente de Pariz em primeira m?o, mas atura todos os dias, no seu escriptorio, uma chusma de clientes, que ?s vezes, o que o contraria muito, o assaltam em plena rua, j? depois d'elle ter fechado o seu escriptorio ?s duas horas da tarde, invariavelmente.

--O que eu quero, berrava o cliente, ? ganhar a queston do rego. Porque, snr. doutor, no rego ? que est? a grande maroteira d'ella. .

Quest?o d'aguas: a mais generalisada especie de litigios no Minho.

Agora, em Braga, o Direito esmagava-o como a clava de Hercules. Fazia d?, fazia pena v?r Jo?o Penha torturado nos colmilhos de um litigante obsesso, a quem elle n?o podia responder, com um repente de Bocage, n'um epigramma vingador.

Aqui esta no que veio a dar aquelle bello espirito do maior improvisador e do maior bohemio da Coimbra de ha vinte annos!

Colhi em Braga informa??es sobre o viver de Jo?o Penha transformado. Tem, como advogado, uma grande clientella posto n?o v? nunca ao tribunal. Mas a sua competencia em quest?es do civel n?o soffre rivalidade. Escrevendo nos processos, ? um jurisconsulto de primeira ordem.

?s duas horas da tarde fecha impreterivelmente o escriptorio. Os clientes voltar?o, se quizerem, no dia seguinte. Mas voltam sempre.

Que ao menos o saboroso b?lo de c?co possa ado?ar as horas amargas da sua banca de advogado!

E Jo?o Penha, sorrindo, voltado para mim, repetia-me:

Na individualidade litteraria de Jo?o Penha ha a distinguir o poeta da bohemia, e o poeta do amor.

S?o dois homens reunidos n'um unico homem. O primeiro ? o estudante que frequenta de noite as tascas de Coimbra, celebrisando-se nas liba??es e nos improvisos; que canta os paios do Alemtejo, o presunto de Lamego e os falernos da Beira; que satyrisa os lentes e adora a Cabula; que v? formar-se em torno de si o numeroso cenaculo a que preside com o applauso e a admira??o da academia inteira, cuja alma, cheia de alegria e de mocidade, elle consubstancia n'uma saliente concretisa??o pessoal.

A baiuca da Cam?lla, sem elle, ficou solitaria como um templo vasio.

Os que foram da gera??o de Jo?o Penha ainda de certo o recordam hoje de monoculo no olho, capa tra?ada, n'uma attitude elegante e vigorosa de Apollo de Belved?re, cantando no templo, sob um imaginario baldaquino de folhas de parra verdejando esmeraldas, a alegria eterna da alma rubra do alcool.

Oh v?s, que do canto sois velhos freguezes, Ouvi d'estas lyras o m?lico emprego! N?s somos as g?mas, os bifes inglezes, Os paios das filhas do claro Mondego.

Sorri-nos a vida nos calices cheios. Dos roixos falernos das parras da Beira; Sorri-nos a C?res dos t?midos seios; Sorri-nos dos bosques a Venus ligeira.

Nos mostos papyros da sciencia moderna A droga se encontra que ao somno convida; Queim?mol-os todos, que s? na taberna Os livros se encontram da sciencia da vida.

Ao vento os cabellos! por montes e valles Corramos no passo das gregas chor?as! Bachantes das pra?as, vibrae os cymbales! Abri-nos as portas, gentis Galath?as!

A lenda das noites das Cam?llas, personificada em Jo?o Penha, subsistiu como uma das seduc??es tradicionaes da vida academica.

Antonio Nobre, que eu julgo ser, de todos os poetas novissimos, o que tem mais poderosas faculdades para traduzir as impress?es da alma moderna, torturada pela nevrose, confessa a suggest?o d'essa lenda bohemia, que reproduz a Poesia ardendo como uma pyra sobre o tampo dos toneis impantes:

......... A Tasca das Cam?llas Para mim, era um sonho, o ceu cheio de estrellas.

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